quinta-feira, 13 de junho de 2013

Biografia de Miguel Schleder por Lauro Schleder

BIOGRAFIA DE MIGUEL SCHLEDER.
por Lauro Schleder.

Escola Municipal Miguel Schleder. 
 Morretes - Paraná - Brasil

Segunda-feira, 19 de setembro de 2011.


MIGUEL SCHLEDER ( II )
Conforme prometi, transcrevo a carta a mim enviada pelo Sr. Lauro Schleder, atendendo ao meu pedido de dados biográficos de Miguel Schleder, quando, para esse fim, visitei-o em 1972. Nela, a insigne figura do Sr. Lauro Scheleder, escritor, jornalista, pesquisador, e acima de tudo um modelo de cavalheirismo e afabilidade, me honra com demonstrações inequívocas do mais alto apreço. Conhecê-lo, embora no curto espaço de uma visita, foi para mim um alto prêmio que, com muito carinho conservo na lembrança.
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Curitiba, 30 de outubro de 1972.
Ilmo. senhor professor José Daher
Morretes (Paraná)

Ao preclaro professor patrício, cumprimento mui cordialmente.
De referência ao seu estimado telefonema, solicitando-me dados biográficos de meu tio MIGUEL SCHLEDER, cujo nome foi dado à Escola de Aplicação dessa cidade, ratifico o que na oportunidade disse ao prezado amigo: poucos elementos eu possuo a respeito daquele parente, isso devido a que, quando se é moço geralmente pouco nos interessamos por tais coisas; e quando entramos na idade provecta topamos com dificuldades para colher, em boa fonte, os elementos para formar correta imagem desta ou daquela personalidade. Mas, vejamos, dentro da velha fórmula do possível, o que se poderá fazer.

Na magnífica obra “GENEALOGIA PARANAENSE” – edição de 1950, de Francisco Negrão (pags. 392/395 do vol. 6), há elementos que indicam que Pedro Schleder, alemão, ferreiro, casado com Luiza Bárbara Rodomarque, com outros alemães vieram da Alemanha para o Brasil, aqui chegando em fevereiro de 1829 localizando-se no RIO NEGRO. Mais tarde, esses alemães, principalmente a família de Pedro Schleder, mudou-se para Curitiba. Pedro Schleder e Luiza Bárbara eram pais de MIGUEL SCHLEDER que aos 12 de junho de 1841, em Curitiba, casava-se com Mariana Pletz,filha de João Pletz. Este casal teve 12 filhos, todos nascidos no Brasil, e que são os seguintes:

1. Pedro; 2. Carolina da Purificação; 3. Margarida; 4. MIGUEL JOSÉ LOURENÇO ( o Miguel Schleder cujo nome foi dado à Escola de Morretes; 5. João Pedro; 6. Francisco Antônio; 7. Antônio Augusto; 8. José Lourenço (um dos companheiros do Barão do Cerro Azul, no maldoso assassínio na Serra do Mar, na trágica noite de 20 de maio de 1894); 9. Luís Miguel (meu pai); 10. Amélia; 11. Maria da Luz; e 12. Catarina. 

(Ver SUBSÍDIOS GENEALÓGICOS - I – Famílias Brasileiras de origem germânica – Publicação conjunta do INST. 

GENEALÓGICO BRASILEIRO e do INSTITUTO “ HANS STADEN” 
São Paulo – 1962 – pgs. 109/110).

Na citada GENEALOGIA PARANAENSE de Francisco Negrão (pgs.cit.) há uma brilhante página sobre MIGUEL SCHLEDER, o ex-aprendiz de ferreiro, professor primário e secundário. 

Essa página vai em anexo a esta carta, e merece ser lida e meditada.

A propósito da vida dos alemães no Rio Negro, criaturas que saíram de um país civilizado, vieram para uma terra que ainda dava os primeiros passos na senda do progresso : deixaram comodidades próprias da Europa para virem enfrentar mil dificuldades nas matas rionegrenses na década de 1820, transcrevo a título de curiosidade, a seguir, uma página que conquanto de autor para mim desconhecido, não deixa de ser expressiva :

“BANDEIRANTES ALEMÃES”

Nossos bisavós, descendentes que eram de uma raça forte, tendo nas veias o sangue germânico, um dia resolveram abandonar a pátria em busca do desconhecido, tal qual o fizeram os intrépidos bandeirantes paulistas. Aqueles, mais audaciosos, porque deixando para trás um país civilizado que lhes proporcionava maior conforto, não se atemorizaram em penetrar as matas selvagens junto das feras e dos nativos, iludidos que foram na sua boa fé. Foi isso que aconteceu. Quando deixaram a pátria idolatrada, para onde nunca mais voltariam, tinham certeza de que iriam habitar uma cidade ou vila onde tivessem contacto com gente civilizada. 
Ao chegarem ao Rio de Janeiro, um aristocrata, que possuía terras em Rio Negro, conseguia que dez famílias das recém chegadas fossem povoar suas glebas; e, dentre as famílias escolhidas estavam os PLETZ, STRESSER E SCHLEDER. No dia 19 de fevereiro de 1828, desembarcou no Paraná a primeira leva de colonos alemães e todos foram conduzidos para RIO NEGRO e jogados no meio da mata. No local em que os colonos se estabeleceram não havia moradores. De quando em vez passavam pela estrada um ou outro viajante que, como os moradores, apenas trocavam simples cumprimentos. Nada podiam conversar, dada a disparidade das línguas alemã e portuguesa.
Contam que esses valentes bandeirantes, abandonados no meio da mata, trataram de construir suas casas e para isso usaram de madeiras que apresentavam maiores facilidades no manuseio e em seguida trataram de cultivar a terra para prover seu sustento.
A zona onde eles se instlaram era habitada por silvícolas que nunca molestaram os colonos, e estes, por sua vez, julgavam que, por sua vez, que os índios eram os habitantes daquelas terras desconhecidas, e com eles não se envolviam. 
Nas noites calmas de verão,quando no céu brilhavam as estrelas e o Cruzeiro do Sul faiscava, aquela gente brava e valente, para espairecer as mágoas e matar as saudades da pátria longínqua se reunia numa só casa e, no momento em que o silêncio caía sobre o aldeamento, quebravam a monotonia daquela solidão os acordes suaves e plangentes de vozes que cantavam canções melodiosas aprendidas quando eram embalados nos braços maternos.
Quando de suas faces rolavam lágrimas de dor, de desespero e de saudade, pelas frestas das janelas eram vistos os bugres contemplando assustados aquele espetáculo maravilhoso. Só os habitantes das selvas testemunharam os sacrifícios e o heroísmo dos povoadores de Rio Negro. Uma senhora alemã, nascida na linda e encantadora cidade de Luxemburgo, não suportando a dor da saudade, morreu de tédio e de tristeza. Foi em Rio Negro que Pedro Schleder e sua mulher Luiza Bárbara semearam, neste novo continente, um novo tronco de família, cujos descendentes são tão brasileiros como aqueles aborígenes que lá habitavam. Houve duas remessas de colonos para Rio Negro a pedido do Barão de Antonina. A primeira foi determinada pelo Conselho do Governo, na sessão de 19 de novembro de 1828 e a segunda pelo Presidente da Província, em 5 de maio de 1829. O Barão de Antonina foi nomeado diretor dessa colônia por ato de 6 de dezembro de 1828.
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Meu pai (Luís Miguel Schleder), irmão de Miguel Schleder ( o do nome da Escola de Morretes), muitas vezes me contou que tio Miguel já era moço e trabalhava como aprendiz de ferreiro de seu pai, também Miguel Schleder. 
Era um simples puxador de fole ... Enamorara-se de uma jovem pertencente a distinta família paranaense, muito prendada, inclusive professora. Miguel, o jovem apaixonado, era de pouca instrução.Logo percebeu o desnível cultural existente,acachapante mesmo, entre os dois. Brioso, pensou e concluiu que se impunha mudar de vida, inclusive estudando e muito, para não ficar inferiorizado perante aquela a quem amava. Foi então que com firmeza ímpar, se atirou ao estudo. Um dia foi à presença do velho e respeitável Miguel Schleder:

- Papai! Preciso estudar e, assim, peço-lhe permissão para freqüentar a escola noturna...
Após uns instantes, cofiando a barba, o venerando ferreiro deu a resposta que não era a esperada por tio Miguel:
- Não! Não dou licença. Eu sei perfeitamente o que você está querendo...: ir para a folia noturna, para a vagabundagem...

E de nada valeram judiciosos argumentos que o jovem pretendeu aduzir, uma vez que naqueles tempos as opiniões paternas eram quase sempre a última palavra...

Muito triste, MIGUEL respeitou a decisão paterna, obedecendo-a, isto é, deixando de matricular-se na escola noturna. Mas sua decisão de estudar era uma obstinação!
Estudaria em casa, sozinho ou com alguém que pudesse ajudá-lo quando não pudesse estudar sozinho...
De noite, lá estava o original estudante queimando as pestanas à luz bruxoleante do candeeiro... De dia, na forja, a mão direita puxando o fole, a esquerda segurando o livro em que estudava...
Era bem a força de vontade, o anseio de progresso, a dedicação perseverante – conjugados objetivando a realização de um ideal impulsionado por jovem e amoroso coração...
Todavia, apesar dos percalços da vida, MIGUEL SCHLEDER foi aos poucos transpondo as maiores dificuldades; desbravou a floresta virgem dos imensos e escondidos conhecimentos humanos, e eis que logra formar-se professor primário!... E foi mais além: certa vez, sentindo-se mais preparado, aventurou um concurso para lente catedrático do Instituto Paranaense (então o estabelecimento de ensino mais categorizado em Curitiba). 
Esse educandário, mais tarde, passou a ser o Ginásio Paranaense, hoje COLÉGIO ESTADUAL DO PARANÁ...
Ora, os professores catedráticos do Instituto Paranaense eram formados, com curso superior. E Miguel Schleder um simples professor primário, ainda há bem pouco um simples aprendiz de ferreiro... Diziam: que audácia do professorzinho! Que insolência!
Diante do preconceito segundo o qual um leigo não podia ser professor do Instituto, causou profunda sensação no vilarejo que na época era nossa hoje trepidante e universitária Curitiba, aquela inaudita audácia de Miguel Schleder.
No dia marcado para a realização do concurso, a cidade, no máximo de sua curiosidade, foi assistir ao espetáculo que, esperava,, seria proporcionado pelo bisonho professorzinho primário...

- Tire o ponto... – disse o Presidente da Banca examinadora..
Miguel Schleder tira um papelzinho dobrado e entrega-o ao Presidente.
- É... um bom ponto...
Miguel Schleder toma conhecimento do conteúdo do ponto, vai à tribuna. Quando todos pensavam que ele ia por-se à disposição da Banca para início dos exames, ouviram:
- Sr. Presidente, peço a palavra pela ordem...
- O examinando tem a palavra.
- Sr. Presidente e demais ilustres Membros da Comissão Examinadora deste Concurso! Com a devida vênia peço para ponderar que o edital publicado e com base no qual me inscrevi para este concurso, não exigia a prestação de exame sobre a matéria constante no ponto sorteado. Houve pois, data vênia, exorbitância na organização dos pontos. Assim, ou essa respeitável Banca haverá por bem permitir-me seja sorteado outro ponto (dentro do regulamento divulgado pelo edital) ou, se assim melhor lhe aprouver, me concede 24 horas para eu prestar exame do referido ponto já sorteado.
Os membros da Banca trocam ideias e, após, seu Presidente se dirige ao examinando:
- A Banca bem considerando procedentes as razões apresentadas,resolveu conceder-lhe o prazo de 24 horas para a prestação do exame relativamente ao ponto já sorteado...
Diante disso, Miguel Schleder vai para casa e afunda-se no estudo do questionado ponto. Segundo se dizia, o ponto sorteado era muito complexo, visto que era fundamentado em outros pontos cujo prévio conhecimento era imperativo. Não se tramava acaso impedir a entrada de um leigo para o convívio daquele egrégio sodalício ? ! ...
Foram 24 horas de estudo puxado! Alguns foram ajudá-lo na pesquisa de elementos para o estudo... Miguel Schleder passou a noite com os pés mergulhados numa bacia de água fria para não dormir ...
No dia seguinte, na hora determinada, ele se apresenta diante da Banca, sob o olhar perquiridor da grande assistência, esta já agora mais benevolente com o jovem examinando; contava com a simpatia daqueles que no dia anterior eram apenas curiosos a estimar um fracasso da audácia. Ele, a essa altura já tinha uma estória conhecida de muita gente; já grangeara a simpatia de quantos amam o trabalho, o estudo e sabem reconhecer os méritos de quem verdadeiramente procura pelo esforço próprio, progredir.
Realizadas normalmente as provas, MIGUEL SCHLEDER foi, afinal, aprovado e nomeado para exercer a cátedra no Instituto Paranaense...
Venceu a obstinação de um coração apaixonado!...
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Meu caro professor José Daher: foi o que pude conseguir a respeito de Miguel Schleder, o que passo às suas mãos atendendo como foi possível, ao seu para mim honroso pedido. Se vier a colher outros dados sobre meu aludido tio, não deixarei de voltar à sua presença, amigo Daher. 
É de mister que os alunos da Escola de Aplicação de Morretes, sua gente, saibam que devia ter havido alguma razão ponderável para que o nome simples de um aprendiz de ferreiro passasse a ser parte integrante de uma escola pública de Morretes.

Abraham Lincoln, um dos mais notáveis vultos da humanidade, também foi nos primórdios de sua existência um simples lenhador...

Ao seu dispor, creia-me, o patrício sempre às ordens.

Lauro Schleder
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Fonte> Blog do prof. José Daher
- Nazir para os íntimos. 
"Páginas Escolhidas"



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